As lições que o futebol nos dá…

Sabemos que muita gente não gosta de futebol, principalmente em nosso país, que muitos, enganosamente, insistem em dizer que é o país do “futebol”. Nunca fomos e talvez nunca sejamos, mas não é esse o caso. Mas, como há muitos que não gostam, há outros muitos que gostam. E o futebol é algo que quando paramos para notá-lo além de nossas paixões, ele pode ser uma ferramenta muito importante para compreender não apenas a sociedade, mas o mundo no qual estamos inseridos.

Há alguns dias nós que gostamos dessa disputa, mesmo tendo nossos clubes do coração, paramos, na medida do possível, para acompanhar a estreia do Flamengo no mundial de clubes disputado no Marrocos. O Flamengo é o atual campeão sul-americano, conquistou a taça pela terceira vez no fim de 2022. Atualmente o clube carioca é um dos poucos em nosso país que pode se orgulhar de suas finanças e também do poder de negociação e contratar jogadores de qualidade acima da média. Tanto que nos últimos anos o clube conquistou dois campeonatos brasileiros, duas Libertadores e mais alguns títulos.

Mas, assim como a Copa do Mundo, o mundial de clubes mostrou que o futebol sul-americano tem perdido cada vez mais espaço. Exceto a conquista da Argentina na Copa disputada no ano passado, desde 2006 somente europeus venciam essa competição. Em copas de clubes, o último sul-americano que sagrou-se campeão foi o Corinthians, em 2012. 

Mas esse também não é o caso. A situação é que os investimentos feitos pela equipe do Flamengo, as últimas conquistas e bom plantel que conseguiu montar, não foram suficientes para fazer com que a equipe brasileira, que representava a América do Sul, conseguisse avançar à decisão. O rubro negro foi superado pelo atual campeão asiático, o Al Hilal da Arábia Saudita. Esse time que foi a base da seleção de seu país e que na estreia na copa passada venceu, de virada, a Argentina, que mesmo com esse tropeço conquistou o título.

Antes do jogo, tanto a torcida do Flamengo quanto boa parte da imprensa esportiva brasiliana cravavam que o time estaria na decisão e enfrentaria o Real Madrid, da Espanha. Muitos não deram a mínima para o time árabe. Quem acompanhou alguns noticiários e debates pode constatar que a euforia era muito grande e todos davam como certa a final entre o time brasileiro contra o espanhol. Muitos ainda comentavam a possibilidade de vitória da equipe carioca na final em decorrência do número de contundidos que o Real apresentava em seu elenco.

Quando os 11 jogadores de cada lado entraram em campo, conseguimos ver que apesar da qualidade técnica, do investimento e de toda soberba de parte da nossa imprensa, o time árabe fez um jogo tranquilo, sem grandes problemas e superou a equipe brasileira por 3 a 2 e garantiu sua vaga na decisão do mundial. Aos brasileiros, restou a disputa do terceiro lugar.

É nesse momento que podemos trazer à tona algumas reflexões: Primeiro, a Argentina, na Copa do Mundo, chegou com uma invencibilidade de mais de 30 jogos e como atual campeã da Copa América. Logo na primeira partida, contra a Arábia Saudita, perdeu e foi obrigada a jogar todas as partidas como uma final, pois havia o risco de ser eliminada logo no segundo jogo. Os argentinos não titubearam e mudaram a postura, olharam de outra maneira para os adversários e jogaram com seriedade e valentia cada jogo.

O impacto da derrota na estreia foi um choque de “realidade” aos hermanos que souberam tirar proveito da situação e levar a disputa do torneio de outra maneira. A segunda lição, é que o futebol sempre nos mostra que não há vitórias ou derrotas antes de uma partida ser disputada e que o adversário deve sempre ser respeitado. A terceira, creio eu, é sempre relembrar a célebre frase de Agostinho de Hipona, ou Santo Agostinho para quem é católico, filósofo do século 5 D.C., que dizia: “prefiro os que me criticam, porque me corrigem, aos que me elogiam, porque me corrompem”. Fiquemos muito atentos com quem somente nos elogia.

Mas quem melhor define como futebol pode nos ensinar para a vida, é o genial filósofo do século 20, o franco-argelino Albert Camus, amante do futebol e que só não seguiu carreira devido a uma tuberculose no final de sua adolescência. Segundo Camus, ex-goleiro, “a bola nunca vem para a gente por onde se espera que ela venha. Isso me ajudou muito na vida, principalmente nas grandes cidades, onde as pessoas não costumam ser aquilo que a gente acha que são as pessoas direitas”.

Ainda de acordo com o filósofo jogador, ele ainda diz que também aprendeu a ganhar sem se sentir um Deus e a perder sem se sentir um lixo. Esses fragmentos do pensamento de Camus nos foram trazidos por meio da excelente obra “Futebol ao sol e à sombra”, do não mais do que magnífico escritor uruguaio, Eduardo Galeano.

Sim, a bola e a falta de sentido do futebol podem nos ensinar muito, o que precisamos, às vezes, é mudar o ponto de vista pelo qual encaramos a situação. Galeano e Camus estão aí para mostrar que a genialidade, pode ser, enxergar o que ninguém consegue ou simplesmente desbanalizar o banal. Se o texto ficou sem sentido me desculpem, mas o que tem sentido?

Ivan Gomes, 45, é produtor e apresentador do programa 3 Notas e torcedor do Santos Futebol Clube

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